domingo, 29 de abril de 2012

Este é o seu lugar

Ontem visionei "Este é o meu Lugar", de Paolo Sorrentino. O filme conta com as interpretações de Sean Penn, Frances McDormand, Judd Hirsch, Eve Hewson, entre outros. A obra foi nomeada para dois prémios David di Donatello da Academia Italiana de Cinema, nas categorias de melhor realizador e melhor guião e ganhou um prémio do júri ecuménico do Festival de Cinema de Cannes de 2011.

Sean Penn interpreta o papel protagonista de Cheyenne, um antigo cantor de rock que parece uma mescla de Robert Smith e Ozzie Osbourne, maquilhando-se diariamente como nos seus dias de glória e falando num voz tom de voz fino e sensível que não se coíbe de praguejar. Cheyenne, apesar do seu aspecto, vai ao centro comercial e ao supermercado como uma pessoa mais, sempre acompanhado de uma mala com rodas e tentando ignorar os risos de quem não compreende os seus gostos estéticos. É casado com uma bombeira bem-disposta e compreensiva e não tem filhos, tendo como substituta a sobrinha punk por quem um simples empregado de mesa se apaixona.
Um dia recebe uma carta que o informa que o pai que nã vê há trinta anos está bastante doente, quiçá às portas da morte. Cheyenne parte com alguma relutância de Dublin para Nova Iorque, mas aquando da chegada já o pai faleceu. É-lhe então entregue uma missão: partir em busca de um ex-soldado nazi que supostamente turturou o pai, que era ainda uma criança quando foi enviado para um campo de concentração. Cheyenne partirá à procura do antigo oficial pelos E.U.A. numa carrinha e com poucas pistas para o guiarem.

O filme aborda temas já explorados noutras obras, como a procura de redenção numa relação entre pai e filho e a necessidade de procurar alguém a fim de perpretuar uma vingança, mesmo que pouco violenta. A narrativa segue, portanto, uma linha clássica, mas possui um elemento que marca a diferença e que reside nos pormenores, sejam estes a ligação das personagens com música, o carácter do protagonista, a filmagem em localizações muito próprias e o humor existente no guião.
Os actores estão bem escolhidos e a presença de temas musicais de há algumas décadas, bem como os momentos surreais e estranhos que provocam o riso tornam o filme agradável de ver, apesar de contar com algumas cenas silenciosas longas que podem tornar-se aborrecidas para alguns espectadores.
Se se está bem-disposto/a e se quer ver algo um pouco diferente do convecional, recomenda-se o filme. Só não é mais indicado para quem precisar de uma dose de adrenalina ou sentir-se irritado.

IndieLisboa'12

Está a ter lugar o 9º Festival Internacional de Cinema Independente em Lisboa. Teve início no passado dia 26 de Abril e terminará a 6 de Maio.
Haverá espaço para curtas e longas-metragens de ficção, documentários, filmes para os mais pequenos, seminários, uma retrospectiva de cinema suiço e a exibição de uma selecção de obras mostradas ao longo dos cinquenta anos do Festival de Cinema de Veneza, que celebra este ano o seu 50º aniversário. Algumas das películas estão a concurso em competições oficiais que premiarão as melhores obras nacionais e internacionais e os novos talentos cinematográficos, havendo ainda distinções outorgadas pelo público e por representantes da Amnistia Internacional e das estações públicas de televisão portuguesas.


A maior parte dos filmes será exibida na Culturgest, no Cinema São Jorge e no Cinema Londres. Aproveite esta oportunidade e conheça novos realizadores e obras, além de aproveitar para visionar os novos trabalhos de alguns importantes nomes do cinema como Abel Ferrara, Andrea Arnold, João Canijo, Ursula Meier, entre outros.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Estreias da semana

Quiçá para aproveitar os lucros que um feriado pode proporcionar à indústria cinematográfica, Portugal decidiu estrear um dia mais cedo os filmes da semana. São estas as estreias do dia 25 de Abril:
  • "Este é o meu Lugar", This must be the place, de Paolo Sorrentino, com Sean Penn, Frances McDormand. Países: Itália, França e Bélgica. Duração: 118 minutos. Cheyenne, um antigo rocker a viver em Dublin descobre que o pai que não vê há cerca de trinta anos está prestes a morrer. Apesar de partir imediatamente para Nova Iorque a fim de acompanhar o pai nos últimos momentos, quando chega já este morreu. Cheyenne decide redimir-se e retoma uma missão inicada pelo progenitor, a de procurar pelos E.U.A. o oficial alemão que o prendeu e humilhou em Auschwitz.
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  • "O Nosso Paraíso", Notre paradis, de Gael Morel, com Stéphane Rideau, Dimitri Durdaine. País: França. Duração: 100 minutos. Este filme trata a relação entre dois homens, um prostituto com outros antecedentes criminais de nome Vassili, e um jovem que encontra perdido num bosque, que não só se torna seu amante como começa a exercer a prostituição com ele e ajudá-lo a roubar os clientes. No entanto, várias ameaças começam a surgir e ambos terão de partir de Paris.
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  • "Os Piratas!" (V.P., V.O., V.P. 3-D), The Pirates! Band of Misfits, de Jeff Newitt e Peter Lord, com as vozes de Hugh Grant, Martin Freeman na versão original e de Adriano Luz, Fernando Luís na versão portuguesa. País: E.U.A. Duração: 88 minutos. Neste filme de animação com os mesmos produtores de "Fuga das Galinhas" (Chicken Rush) e "Wallace e Gromit" (Wallace and Gromit), os piratas são os protagonistas. O Capitão Pirata, farto de perder a competição anual que onde se atribui o prémio Pirata do Ano, está decidido a vencê-la pela primeira vez. Enfrentará muitos desafios, alguns com poderosos piratas e cruzar-se-á com personagens históricas como Darwin ou a rainha Vitória.
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  • "Os Vingadores", The Avengers, de Joss Whedon, com Chris Hemworth, Samuel L. Jackson, Robert Downey Jr., Scarlett Johansson. País: E.U.A. Duração: 142 minutos. Nick Fury, o director da agência S.H.I.E.L.D., responsável pela manutenção da paz global, depara-se com um exército liderado pelo malévolo deus Loki que poderá afectar a segurança do mundo. Para combater o problema, Fury contrata alguns dos mais poderosos heróis e super-heróis para formar uma equipa poderosa, tais como Thor, o Homem de Ferro, Hulk ou a Viúva Negra.

terça-feira, 24 de abril de 2012

A rapariga em chamas

O primeiro livro da trilogia "Os Jogos da Fome", The Hunger Games, da autoria de Suzanne Collins, foi transposto para o cinema num filme realizado por Gary Ross e protagonizado por Jennifer Lawrence, actriz já nomeada para um Óscar por um papel principal em 2011, que interpreta a corajosa e aventureira Katniss Everdeen. A adaptação cinematográfica do livro lançado em 2008 tem sido um sucesso de bilheteiras, principalmente nos E.U.A., onde já arrecadou mais de 300 milhões de dólares.

O livro é bastante interessante e intenso. Narrado na primeira pessoa pela personagem principal, Katniss, transmite muito eficazmente as suas sensações, os seus receios e as suas suspeitas. É uma obra fácil de ler e muito visual, devendo-se isto ao facto de a protagonista ser uma jovem de dezasseis anos vinda de um meio pouco favorecido que tem uma grande relação com a natureza e que já sofreu bastante na vida, algo que a leva a ser algo desconfiada. A autora consegue criar um ambiente tenso que cativa o leitor e narrativas paralelas curiosas que tornam o texto mais rico.
"Os Jogos da Fome" contém elementos de aventura, romance e acção, mas também é uma crítica política e social que, apesar de ter como tempo da acção um futuro algo distante e distópico, parte de temáticas contemporâneas. Há uma crítica aos excessos e à artificialidade dos reality-shows, às diferenças de condições de vida que existem mesmo nos países mais ricos, à violência gratuita oferecida pelos meios de comunicação e o desejo dos governos de entreter as massas. Alguns leitores poderão algumas dos romances de conteúdo político de George Orwell.
O primeiro livro tem a mesma designação que o maior evento televisivo e social que tem lugar todos os anos em Panem, um país que reúne os antigos países da América do Norte em doze distritos. Nesse concurso, dozes pares de jovens entre os doze e os dezoito anos, formados por um membro masculino e outro feminino, são seleccionados à sorte para representarem o seu distrito numa arena que pode tanto ser uma floresta como as ruínas de um edifício, onde irão lutar pela sua vida até restar só um indivíduo, o vencedor. Até alcançar a vitória, esse jovem poderá ter de matar outros concorrentes, esperar que morra devido a desidratação ou a uma infecção, destruir-lhe ou roubar-lhe os alimentos, entre outras artimanhas. Os concorrentes são designados por "tributos" e o governo afirma usá-los para recordar aos restantes habitantes os terrores, as mortes e a violência da guerra que culminou com a formação de Panem.
Em "Os Jogos da Fome", os representantes do distrito 12, que proporciona minérios e carvão ao resto do país, são Katniss Everdeen, que se oferece como tributo após a sua irmã ter sido inicialmente seleccionada, e Peeta Mellark, o filho mais novo dos donos de uma padaria. Porém, uma revelação de Peeta vai uni-los e tornar o concurso mais confuso para Katniss.

A adaptação ao cinema é fiel à essência do livro, ao conceito do concurso, à narrativa principal e ao seu sentido crítico. No entanto, houve uns quantos pormenores eliminados ou alterados e alguns deles poderiam ter melhorado o filme.
Apesar de tudo, esta é uma boa película que deve ser vista além do que é mostrado no ecrã. A banda-sonora e a caracterização estão bem conseguidas e os actores também merecem ser destacados, principalmente Jennifer Lawrence, que já tinha mostrado os seus dotes para interpretar personagens femininas fortes e independentes.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Estreias da semana

 São estes os filmes que estreiam hoje nas salas portuguesas:

  • "Assim Assim", de Sérgio Graciano, com Ana Brandão, Cleia Almada, Ivo Canelas, Nuno Lopes. País: Portugal. Duração: 97 minutos. Trata-se da versão longa de uma curta-metragem homónima do mesmo realizador que parte do encontro de cinco pessoas numa esplanada e cujas vidas e aventuras e desventuras amorosas serão analizadas, bem como as ilusões e os ideias de amor das personagens.
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  • "Batalha Naval", Battleship, de Peter Berg, com Rihanna, Taylor Kitsch. País: E.U.A. Duração: 120 minutos. Baseado na versão da Hasbro do famoso jogo de estratégia, este é um filme de acção em que uma poderosa armada internacional, enquanto pratica um exercício de guerra no mar, depara-se com  um exército marítimo alienígena que terá de enfrentar para perceber quais são os seus terríveis objectivos e travá-los.
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  • "Capitães da Areia", de Cecília Amado y Guy Gonçalvez, com Ana Graciela, Israel Gouvea. País. Brasil. Duração: 96 minutos. Adaptada de um romance de Jorge Amado, esta é uma narrativa que acompanha um grupo de meninos de rua que, na Baía dos anos 50, dedica os dias a brincadeiras e pequenos furtos e as noites a dormir num armazém, o Trapiche. Um dia chega à zona uma personagem feminina, Dora, que vai mudar as regras do grupo e ajudá-los a ver que a vida é muito mais ampla do que eles julgam.
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  • "O Exótico Hotel Marigold", The Best Exotic Marigold Hotel, de John Madden, com Bill Nighy, Maggie Smith. País: Reino Unido. Duração: 124 minutos. Nesta adaptação do romance homónimo de Deborah Moggach, um grupo de reformados britânicos parte para a Índia para desfrutar do exotismo do país numa estância de luxo. No entanto, o país não é tão magnífico como imaginavam à primeira vista e só irão encontrar os seus encantos de maneiras inesperadas.
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  • "Terraferma", Terraferma, de Emanuele Crialese, com Donatella Finocchiaro, Filippo Pucillo. País: Itália. Duração: 88 minutos. A família siciliana Pucillo enfrenta uma perda de identidade: o pai está morto, o avó e o tio competem pelo uso a dar ao barco familiar e o filho tenta mediar os confrontos, enquanto a mãe vê a vida passar sem nada esperar dela. Mas tudo muda quando uns imigrantes africanos chegam à ilha, pois nem todos lidarão bem com a situação.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Voando sobre os problemas

"Voando Sobre um Ninho de Cucos", de título original One Flew Over the Cuckoo's Nest, é um dos mais aclamados filmes de Milos Forman, o realizador checo que se naturalizou estado-unidense e já ganhou dois Óscares da Academia Americana de Cinema como realizador. O filme data de 1975 e adapta para o grande ecrã um romance de Ken Kesey. Jack Nicholson protagonizou a película e foi bastante elogiado.

"Voando Sobre um Ninho de Cucos" retrata as vivências de diversos doentes e de profissionais de saúde num hospital psiquiátrico. R.P. McMurphy, a personagem principal, um homem violento que se quer ver livre do campo de trabalhos forçados onde está a cumprir uma pena, é enviado para a instituição a fim de ser avaliado após apresentar comportamentos que roçam a loucura; no entanto, os psiquiatras desconfiam da autenticidade do seu temperamento. Esta chegada altera as rotinas e as atitudes dos outros doentes; McMurphy confronta e provoca a enfermeira-chefe da instituição, incentiva os pacientes a divertirem-se e a seguirem as suas vontades e ajuda-os lentamente, sem ser esse o seu objectivo inicial, a ganharem alguma independência mental.

Esta película é uma interessante e complexa obra sobre a descoberta do verdadeiro ser e dos seus impulsos, sobre pessoas que, como cucos, foram abandonadas num sítio que lhes dá uma identidade que não é a sua. "Voando Sobre um Ninho de Cucos" está muito bem orquestrado ao nível da recriação dos antigos tratamentos psiquiátricos que tentavam travar de maneira desumana a humanidade e a animalidade dos doentes.
Os actores interpretam impecavelmente os seus papéis. Nicholson é sempre eficaz no papel de rebelde ou de louco; Louise Fletcher interpreta uma enfermeira-chefe autoritária e ambígua com uma frieza arrepiante; Danny DeVito, Brad Dourif e os outros actores que interpretam os pacientes conferem a cada personagem um carácter próprio que vai lentamente desflorando-se ao longo da narrativa.
É um filme muito recomendável. 

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Estreias da semana

Estas são as estreias de hoje, dia 12 de Abril.

  • "12 Horas para Viver", Gone, de Heitor Dhalia, com Amanda Seyfried, Jennifer Carpenter. País: E.U.A. Duração: 94 minutos. Este filme narra um traumático episódio que envolve duas irmãs. Molly está desaparecida, mas Jill acredita que ela foi raptada pelo mesmo assassino em série implacável de cujo cativeiro escapou um ano antes. Os polícias não têm provas que tal tenha sucedido e prosseguem as suas próprias investigações, pelo que a desesperada Jill decide encontrar a irmã pelos seus próprios meios. No entanto, Jill não se encontra bem psiquicamente, significando que ela tanto pode estar a imaginar detalhes do desaparecimento como estar completamente certa.

  • "3", de Tom Tykwer, com Angela Winkler, Sebastian Schipper. País: Alemanha. Duração: 119 minutos. A narrativa centra-se inicialmente em Hanna e Simon, marido e mulher há cerca de vinte anos e que já atravessou muitas dificuldades conjugais. Surge então Adam, por quem ambos se acabarão por apaixonar. Adam mantém relações com os membros do casal separadamente, mas estas serão postas em causa quando Hanna engravidar.

  • "E agora, onde vamos?", Et maintenant, on va où?, de Nadine Labaki, com Claude Baz Moussawbaa, Leyla Hakim, Nadine Labaki, Yvonne Maalouf. País: França. Duração: 110 minutos. Depois de "Caramelo", Nadine Labaki volta a realizar um filme com guião escrito pela própria no qual participa como actriz. A narrativa trata de um grupo de mulheres libanesas que, quando visita os maridos falecidos na guerra com Israel a descansar no cemitério da área, se separa em dois grupos. Todas elas bem como os seus vizinhos têm de lidar com o confronto existente na aldeia entre a cristandade de uns e o credo muçulmano de outros.
  • "Espelho Meu, Espelho Meu! Há Alguém Mais Gira do que Eu?" (V.O. e V.P.), Mirror, Mirror, de Tarsem Singh, com Lily Collins, Julia Roberts. País: E.U.A. Duração: 106 minutos. Nesta versão em carne e osso do conto "Branca de Neve e os Sete Anões" dos irmãos Grimm, Branca de Neve é expulsa do reino pela malvada e narcisista madrasta e une-se a sete anões para recuperar o seu lugar como herdeira ao trono do seu pai.
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  • "Linha Vermelha", de José Filipe Costa. País: Portugal. Duração: 104 minutos. Com este documentário, o espectador poderá recordar o documentário "Torre Bela", de Thomas Harlan, filmado em 1975, que pretendia dar a conhecer melhor o caso da ocupação de uma herdade no Ribatejo pertencente aos duques de Lafões e os conflitos gerados entre os donos, os novos ocupantes e os militares lisboetas que tencionavam renovar o país após destronarem um regime ditactorial. O realizador regressa à zona onde a guerra de interesses teve lugar e tenta saber mais sobre a importância que o filme teve na família dos duques e nas pessoas que acompanharam, através das câmaras, toda a situação por trás de "Torre Bela".
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  • "Projecto X - Fora de Controlo", Project X, de Nima Nourizadeh, com Dax Flame, Oliver Cooper. País: E.U.A. Duração: 88 minutos. Três finalistas do secundário organizam uma festa com o objectivo de se tornarem mais populares. Contudo, o número de interessados aumenta, e quando a festa tem lugar, a variedade e a quantidade de participantes acaba por trazer problemas ainda maiores que os expectáveis, envolvendo bebida, drogas e até a polícia.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Singularidades de um cineasta

Há uns dias tive oportunidade de visionar pela primeira vez um filme de Manoel de Oliveira na íntegra. Era um dos mais recentes, "Singularidades de uma Rapariga Loura".
Já tinha visto alguns excertos de filmes de Oliveira. Uns pareceram-me interessantes, com diálogos complexos e meditativos, outros perfeitamente dispensáveis, meros exercícios de cinema. Oliveira é um dos mais respeitados cineastas portugueses e é o mais idoso em actividade e algo deverá ter pelo menos parte da sua obra para que ele seja elogiado como é. No entanto, desconfio tratar-se o senhor de Oliveira de um artista com um rol de obras de qualidade inconstante e que desagrada a muitos espectadores.
Este "Singularidades de uma Rapariga Loura" adapta um conto de Eça de Queirós aos tempos modernos. Macário trabalha nuns armazéns de venda de tecidos e que experimenta a paixão e a desgraça à custa de uma jovem que se refresca com um leque chinês enquanto passa a maior parte do tempo numa das divisões da casa familiar, cuja janela está em frente à da do escritório do protagonista. Macário conta toda a história que envolveu ambos a uma curiosa mulher num comboio a caminho do Algarve, sendo a narrativa central mostrada como uma série de analepses e memórias.

Certamente, esta não terá sido a melhor escolha para me iniciar no cinema de Manoel de Oliveira. "Aniki Bobó", "Douro, Faina Fluvial", "Vale Abraão" teriam sido talvez melhores apostas.
"Singularidades de uma Rapariga Loura" peca em muitos aspectos. Para já, a transposição da narrativa de Eça de Queirós podia ter sido mais criativa, mantendo aspectos do texto original, mas moldando-o a uma realidade contemporânea, tendo como exemplos de casos semelhantes mais bem-sucedidos "Romeu e Julieta" (Romeo+Juliet) ou "Coriolano" (Corialanus), entre outras adaptações da obra de Shakespeare ao grande ecrã. O filme de Oliveira, ao não conseguir esse feito, cria um filme de ficção inverosímil. Hoje faria sentido alguém ganhar uma fortuna com um negócio pequeno em Cabo Verde? Um romance como o de Macário e Luísa teria no Portugal actual um desfecho como aquele?
Outra das falhas de "Singularidades de uma Rapariga Loura" é a teatralidade dos actores. O seu tom e a sua postura em cena são quase artificiais, algo que noto em muitos filmes portugueses, que parecem recriações de peças de teatro exageradas em vez do que devem ser. O actor principal, Ricardo Trêpa, neto de Manoel de Oliveira, tem uma má prestação na película, desinspirada a maior parte das vezes e inverosímil.
Peço também ao senhor de Oliveira para ter cuidado com os lugares-comuns. Alguns aceitam-me, outros são inevitáveis, mas existem os definitavemente evitáveis e patetas. Uma mulher que ergue a metade inferior da perninha enquanto recebe um beijo é mais do um cliché, é uma imagem kitsch que hoje não tem grande valor.
O avançar da trama está bem conseguido, mas as falhas são demasiadas.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Estreias da semana

Estas são as estreias da semana de 5 de Abril de 2012. Os espectadores poderão reencontrar nas salas personagens suas conhecidas e um aplaudido filme português.

  • "American Pie: O Reencontro", American Reunion, de Hayden Schlossberg e Jon Hurwitz, com Jason Biggs, Alyson Hanigan, Sean William Scott, Tara Reid. País: E.U.A. Duração: 122 minutos. Possível capítulo final da série de filmes cómicos American Pie, gira à volta da evolução das suas personagens principais. Após casamentos, relações falhadas e um bebé, todos se encontram num fim-de-semana onde irão recordar o espírito juvenil que marcou as suas maiores aventuras e tudo o que passaram juntos.
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  • "ETs in da Bairro", Attack the Block, de Joe Cornish, com John Boyega, Jodie Whittaker. País: Reino Unido. Duração: 88 minutos. Este filme, dos mesmos produtores de Shaun of the Dead (a paródia aos filmes de zombies que recebeu em Portugal o patético título "Zombies Party - Uma Noite... de Morte", quando se poderia ter atribuído outro mais cómico, aproveitando o facto de o título ser um jogo de palavras com base noutro filme do género, Dawn of the Dead; este novo filme teve uma sorte similar na intitulação), é uma mistura de terror, ficção científica e comédia. A película é protagonizada por um grupo de delinquentes do Sul de Londres que vai defender o seu bairro contra uma invasão alienígena.
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  • "Na Terra de Sangue e Mel", In the Land of Blood and Honey, de Angelina Jolie, com Rade Serbedzija, Zana Marjanovic. País: E.U.A. Duração: 127 minutos. Esta é a estreia de Angelia Jolie como realizadora, assinando também o guião, que se inspirou no seu trabalho como embaixadora da ONU pelos refugiados e a necessidade de dar a conhecer o caso da guerra entre a Bósnia e a Sérvia. A narrativa centra-se num romance proibido entre Danijel, um soldado sérvio que reencontra num campo de guerra um velho amor, Ajla. Devido ao conflito, a relação entre eles sofre alterações.
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  • "Tabu", de Miguel Gomes, com Teresa Madruga, Laura Soveral. País: Portugal. Duração: 85 minutos. Este filme, premiado no Festival de Berlim deste ano com dois importantes prémios, rodado em grande parte a preto e branco, narra eventos do presente e do passado colonial português. Pilar é uma mulher que tenta endireitar e abrilhantar o mundo à sua volta, sendo uma das suas maiores inquietações a solidão da sua vizinha Aurora. Ela é uma velhota amarga que um dia faz um pedido que Pilar e a criada de Aurora, Santa, tentarão cumprir e que envolve um homem e algo ocorrido há cinquenta anos, quando a solitária velha tinha uma fazenda em África.
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  • "Titanic (3D)", Titanic 3D, de James Cameron, com Leonardo DiCaprio, Kate Winslet. País: E.U.A. Duração: 194 minutos. O filme de 1997 de Cameron que ganhou onze Óscares da Academia Americana de Cinema e rendeu cerca de 1,8 mil milhões de dólares em receitas de bilheteira a nível mundial regressa em formato de três dimensões. Os que gostaram do título poderão reviver a relação amorosa entre uma jovem da alta sociedade britânica e um rapaz americano pobre e liberal com alguns talentos artísticos, cujo amor quer quebrar barreiras.

domingo, 1 de abril de 2012

Herói tirano

Ontem visionei nos cinemas a mais recente adaptação britânica de uma peça de Shakespeare ao cinema. Coube a honra ao texto dramático "Coriolano", Coriolanus, uma tragédia de 1608 baseada nos feitos de um lendário militar romano, cujo espaço narrativo foi transposto para o mundo actual. Ralph Fiennes realiza e protagoniza o filme, rodado no Reino Unido, na Sérvia e em Montenegro.

Caio Márcio Coriolano, um general que defende a sua querida Roma contra os ataques de um grupo armado de volscos cujos territórios foram tomados, está prestes a ser designado cônsul. No entanto, precisa dos votos do povo romano, que despreza, apesar da sua importância para a decisão final do conselho da cidade. Obter esses votos é uma tarefa bem mais difícil do que Coriolano pensa, pois o povo desconfia de todos os seus feitos guerreiros, desafiando-o por limitar as liberdades civis e ter em tão baixa consideração os seus concidadãos. O general acaba por ser banido de Roma agressivamente, decidindo então vingar-se da cidade aliando-se ao seu grande inimigo de combate, o general volsco Tulo Aufídio.

O filme, seguindo a tradição de outras versões actualizadas de peças da Shakespeare, preserva os diálogos escritos em inglês antigo e une-as a elementos da sociedade moderna, como o meio televisivo, os telemóveis e redes sociais como maneira de transmitir informações, ou as armas utilizadas. Este aspecto, embora possa provocar estranheza em alguns, é bastante interessante e parece colocar o espectador perante um palco de teatro.
"Coriolano" é também uma narrativa que explora os meandros da democracia: é possível existir em pleno? Todos podem ser livres, ou precisam sempre de alguém que os dirija? Quem os dirige não poderá um dia acabar por ser tomado pela fome de poder?
Creio que o filme está bem construído e conseguiu alterar o espaço da peça original sem destruí-la e sem criar algo soporífero ou, por outro lado, algo mais parecido a um "blockbuster" de acção e aventuras. Há várias sequências que envolvem muitas armas e trocas de tiros que poderiam ser reduzidas, mas em si não enjaulam a mensagem política de "Coriolano".
O eleno está bem escolhido e Ralph Fiennes é bastante convincente no papel do controverso general Coriolano, com a cabeça rapada, um olhar azul e penetrante e as suas mudanças de humor. Não receiem se este Coriolano se parecer muito ao Voldemort das adaptações cinematográficas de "Harry Potter"; Fiennes é muito bom a interpretar personagens tenebrosas com um passado conturbado.
Elogiem-se igualmente as canções em língua sérvia acrescentadas à banda-sonora, que parecem conferir um carácter mais trágico ao filme.